domingo, 7 de julho de 2019

A torcida ao contrário

Memórias das histórias que vimos, ouvimos ou vivemos.
   Talvez a gente demore muito tempo para perceber as coisas, talvez mesmo, nunca perceba e passe em branco a possibilidade. Seria mais fácil se a vida fosse assim, a gente não teria que pensar no que não deu certo, ninguém pensa no que não existiu. 
   Era difícil entender aqueles tempos. A vida tinha virado pelo averso e algumas vezes ele se perguntava a razão daquilo. Na sua cidade havia uma velha ponte de ferro e ele sempre visitava nos finais de tarde, depois de pedaladas. Gostava de jogar pedras nas águas e naquele exercício pensava bastante na vida. 
   Ele sempre colocou a vida em caixinhas. A caixinha da vida profissional, a caixinha da família, da vida social, da diversão e do amor. Ficava mais fácil reagir quando alguma coisa estava bagunçada, era só pegar a caixinha, tirar tudo de dentro e reorganizar, até ali tinha dado certo, com algumas perdas de objeto aqui e acolá mas, vinha dando certo.
   Naquele ano, parece que a vida resolveu criar um terremoto e derrubar todas as caixinhas. Na hora de juntar, colocou coisas de uma caixinha em outra e confusão estava feita. Passou meses reorganizando, comprando cadeados para algumas caixinhas mais problemáticas não se abrirem e organizou as outras até que tudo começou a seguir rumo. 
   Lá para setembro, estava bem crédulo que as coisas iriam voltar ao normal, o ano seguinte já estava previamente planejado e a vida voltaria ao sentido que sempre teve. Mas, um furacão passou nos seus olhos em um sábado de aulas. Os dias se passaram e o furacão foi entrando na morada, revirando o que podia e deixando ele tão preso no olho que já não sabia se queria fechar as portas para o furacão não entrar ou que ele o levasse mundo pelo mundo.
   Então o furacão chegou nas caixinhas, revirou algumas e as outras que estavam com cadeados ficaram de ponta a cabeça. Ele as guardou em local seguro, fez prece a deusa dos ventos e pediu que o furacão fosse embora, assumindo sua fraqueza para ele. 
   Depois que o furacão se foi ele voltou a organizar as caixas e ai veio uma reflexão. Na sua caixa mais cuidadosa ele já não tinha nada mais a guardar, o furacão passou e levou tudo. Ele se culpou a princípio, como deixou aquilo acontecer, não deveria, poderia ter fechado todas as portas antes dele passar.
- Que droga - murmurava enquanto jogava pedras no rio.
   Fechou os olhos e lembrou da passagem do furacão, de quanto dançava feliz com o vento no rosto, que embora trouxesse poeira, trazia o cheiro de uma felicidade irresponsável, mas, prazerosa. Lembrou que ele mesmo abriu a caixa, jogou ao centro do furacão e que nessa hora o coração palpitava tão feliz que o mundo parava e ele controlava todo aquele momento.
- Droga nada, era isso que eu queria, é isso que eu quero!
   Apressou-se em sair dali, pegou a bicicleta e pedalou de pressa, o vento batia em seu rosto e ele lembrava do furacão. 
- Tomara que ela tenha guardado os meus sonhos. 

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